Sunday, April 7, 2019

re slavery abolition, Brazil


O Império das Américas
FAMÍLIA IMPERIAL ABOLICIONISTA, POVO ESCRAVOCRATA
A escravidão, além de sustentar a produção agrícola e os serviços urbanos, perpassava a vida social de alto a baixo. Não havia no Brasil território livre de escravidão. Norte e Sul, Leste e Oeste, cidade e campo, eram escravistas. E, como escreveu Joaquim Nabuco, a escravidão não tinha preconceito de cor. Até mesmo libertos costumavam possuir escravos, é houve casos de escravos donos de escravos. Quando os escravos malês se rebelaram, em 1835, buscavam a liberdade apenas para os irmãos de fé muçulmana.
Tocar no assunto era quase proibido. José Bonifácio, um dos poucos homens públicos que teve a coragem de atacar diretamente o regime escravista, ficou encarregado de educar o jovem Imperador Dom Pedro ll. Ao ser coroado, com menos de 16 anos de idade, em julho de 1841, o Monarca libertou todos os escravos do palácio.
Quando o ministério conservador, sob a liderança de Eusébio de Queirós, decidiu acabar com o tráfico de escravos, em 1850, ele apoiou. Além disso, apoiou, em 1855, as medidas drásticas adotadas pelo ministro da justiça Nabuco de Araújo.
Fora do campo da política, sua antipatia pelos traficantes de escravos manifestava-se no fato de se recusar a lhes conceder títulos de nobreza.
Em janeiro de 1864, Dom Pedro ll mandou instruções ao Primeiro Ministro, Zacarias de Góis, dizendo-se preocupado com o que se passava nos Estados Unidos e sugerindo que o Brasil iniciasse o processo abolicionista com uma lei de libertação do ventre. No ano seguinte, em conversa particular com Louis e Elizabeth Agassiz, o Monarca declarou enfaticamente : " A escravidão é uma terrível maldição sobre qualquer nação, mas ele deve, e irá, desaparecer entre nós ". A Imperatriz Dona Teresa Cristina falou no mesmo sentido.
A Guerra da Tríplice Aliança no fim desse ano adiou a discussão. Mas essa mesma guerra reforçou a postura abolicionista do Imperador. Os Agassiz, anotaram no diário de viagem : " Se o seu poder se igualasse a sua vontade, a escravidão desaparecia do Império de um só golpe ". Em carta a Condessa de Barral, de 23 de novembro de 1866, Dom Pedro ll anunciou a partida para a guerra e acrescentou : " Tomara que já se possam libertar todos os escravos da nação, e providenciar a respeito da emancipação dos outros. Há de se lá chegar e grande será a minha satisfação ".
Solicitou a seu constitucionalista preferido, o Senador Pimenta Bueno, que redigisse projetos abolicionistas. Bueno apresentou-lhe em janeiro de 1866 cinco projetos que se tornaram a base para a futura Lei de Liberação do Ventre Escravo. Foram levados ao Conselho de Ministros, cujo Presidente, o marquês de Olinda, era viceralmente contra a discussão do tema, e não tomou providências. O Conselho de Estado foi chamado a opinar. Quase todos os conselheiros julgou importuna a medida do Imperador por causa da guerra. Houve cítricas diretas ao Imperador pela precipitação da iniciativa. O mesmo Visconde do Rio Branco que quatro anos depois faria aprovar a Lei do Ventre Livre afirmou : " Não há entre nós um partido que tomasse a peito a abolição da escravidao ". Fora do Congresso, a reação veio, sobretudo, das províncias do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, que, juntas, concentravam 57 % do total de 1,5 milhões de escravos existentes no país. Os proprietários de escravos dessas províncias esqueceram suas divergências políticas e se mobilizaram para combater a proposta. Renovaram-se as acusações de que o projeto de libertação do ventre escravo era inspiração da família imperial e não nacional. O jornal A República combateu o projeto por ser de iniciativa imperial e não das câmaras; fora elaborado " nas trevas do palácio ", à revelia da nação, segundo ele. Voltaram também as acusações de despotismo dirigidas contra o Poder Moderador do Imperador. A situação era esdrúxula e revelava a ironia da representação política no Império.
A se dar crédito às posições dos críticos, inclusive republicanos, o abolicionismo era despotismo, o escravismo era a democracia.
O projeto passou na Câmara por 61 votos a 35 e foi aprovado no Senado com menor dificuldade. O imperador não teve a satisfação de sancionar a lei. No momento, já se achava na Europa. Sancionou-a a regente e filha, princesa Isabel.
O tema da abolição da escravidao só retornou às preocupações do monarca e à agenda do governo em 1884, quando novamente, e até a abolição final, se verificou o mesmo desencontro entre representação parlamentar e democracia.
FONTE
Baseado em trecho do livro " Dom Pedro ll, ser ou não ser ", do historiador José Murilo de Carvalho



















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